"Sou um filho da Terra e do Céu Estrelado. Estou sedento. Por favor, dê-me de beber da Fonte da Memória."Invocação de reconhecimento entre os membros da Fraternidade de Mitra, encenada em "Da Vinci’s Demons"
Caros
Não morremos ainda, pelo menos literalmente. Não faria sentido um Imortal morrer, a não ser que fosse para ressuscitar. No momento em que os ânimos estão à flor da pele, mais necessário ainda se faz uma boa dose de racionalidade para que possamos seguir adiante. E acabei me valendo de uma analogia recente para tentar explicar os motivos para a nação tricolor não entrar em pânico e não se atirar da ponte do Guaíba. Há poucas semanas o canal Fox iniciou a transmissão de uma interessante série chamada Da Vinci’s Demons, a qual discorre sobre a juventude de Leonardo da Vinci. Como Leonardo é um tema sobre o qual já estudei muito, naturalmente que a série me atraiu. E fiquei agraciado com o fato de citarem na série uma parte mais oculta da vida do mestre, no caso, sua ligação com a Fraternidade de Mitra.
Pra quem matou a aula de história, vou fazer um breve resumo. Mitra era uma divindade indo-persa cujo culto iniciático teve grande expansão durante o império romano. Na série, Leonardo encontra-se pela primeira vez com um sacerdote da fraternidade, que lhe cita um interessante dogma. "Já ouviu o ditado "o tempo é um rio"? O que a maioria não compreende é que o rio é circular. O fim de um ciclo sempre dá início a outro que seguirá novamente até o fim. Muito do que se chama de "progresso" simplesmente é uma questão de lembrar o que foi esquecido." Como Leonardo sempre foi um artista multimídia, sua sede de criar era muito grande. A história cogita que sua familiaridade com a Fraternidade de Mitra lhe forneceu muitos dos subsídios necessários para suas fantásticas e inovadoras criações. O mesmo sacerdote também lhe cita a frase que servia como identificação entre os membros: "Sou um filho da Terra e do Céu Estrelado. Estou sedento. Por favor, dê-me de beber da Fonte da Memória." A série é bem interessante, apesar de alguns pecados históricos e algumas forçadas de barra. Mas vale a pena.
Assim como Leonardo, muitos torcedores gremistas estão com grande necessidade de beber da fonte da memória. Alguns por não terem vivido a época, outros por a terem esquecido, sabe-se lá o motivo. Em 1982 o Grêmio havia conquistado o vice-campeonato brasileiro, perdendo-o para o Flamengo em uma final muito polêmica, com o juiz roubando descaradamente (desde aquela época). Diante disso, nada mais natural do que manter a base para buscar o título da Libertadores em 1983. Mas o Grêmio iniciou aquele glorioso ano de forma muito complicada, pois Espinosa tinha grandes dificuldades em encontrar a formação ideal do time (alguma coincidência com o presente?). Renato Portaluppi vivia lesionado e com problemas de indisciplina. O Grêmio contava com Remi, um goleiro não muito confiável. E Paulo Roberto, um grande lateral que inclusive era convocado para a seleção, às vezes não ficava nem no banco. No final de abril daquele ano o Grêmio recebia a fraca equipe da Ferroviária de Araraquara pelo nacional no Olímpico. A equipe paulista vinha inclusive desfalcada de seu técnico, que havia assumido um cargo na CBF. Com um empate o tricolor estaria classificado, barbadinha. Mas perdeu o jogo por 3 a 1 e foi desclassificado em casa, uma tragédia. Na ocasião, Koff segurou Espinosa no comando da equipe e promoveu algumas alterações no time. Baidek foi fixado na zaga, Paulo Roberto assumiu a lateral-direita e o goleiro Mazaropi foi contratado para o gol. O resto da história espera-se que qualquer um saiba. Aquele até hoje é o maior ano da história do clube.
Em 1993, Koff assumiu um Grêmio destroçado, recém egresso da segundona. Contratou o técnico Sérgio Cosme, que no ano anterior havia conseguido a proeza de perder a final da Copa do Brasil para o timeco da beira do lago, treinando o Fluminense. De contrapeso, Cosme solicitou a contratação de seu preparador físico, um desconhecido Paulo Paixão. Com um time base barato, montado com refugos, o Grêmio conseguiu conquistar o ruralito e surpreendentemente chegou à final da Copa do Brasil, a qual não conquistou por conta de um peru do nada saudoso goleiro Eduardo Heuser. Um ano quase perdido, com apenas uma taça de ruralito no armário. Tudo isto, aliado a outros fatores, fez Koff dispensar Cosme e contratar Felipão, mantendo o preparador físico. O time foi reforçado, ainda com peças baratas, e continuava sem ganhar nada. A torcida pedia a cabeça de Felipão, mas Koff manteve-se fiel a seu planejamento e o Grêmio conquistou o ruralito e a Copa do Brasil. O time campeão foi mantido? Não, foi quase todo reformulado para o ano seguinte. Em 1994 a base do Grêmio era formada por pratas da casa (apostas) e alguns veteranos meia-boca (era o que dava pra contratar). Com uma base formada por Danrlei; Ayupe, Paulão, Agnaldo e Roger; Pingo, Jamir, Emerson e Carlos Miguel; Fabinho e Nildo não daria para sonhar mesmo com muita coisa. Então foi montado o time de 1995, mantendo os pratas da casa (naquele ano, Emerson foi substituído por Arilson, por conta de uma grave lesão) e contratadas algumas apostas desconhecidas, como Arce e Rivarola, veteranos esquecidos, como Dinho, Goiano e Adilson, além de refugos, como Paulo Nunes e Jardel. O resultado creio que todos também já sabem.
O ponto em comum neste período foi a presença de Koff na presidência. E o período que separou ambas as gestões foi de uma década (quase o que ocorre hoje). Como citado, não há que inventar-se a roda, basta melhorá-la. Não adianta pensar no presente ou no futuro sem ver o que deu certo no passado. Também não adianta apenas seguir o que se fez no passado, devemos nos adaptar aos novos tempos. O equilíbrio é a base que pode fornecer o sucesso para um clube de futebol, aliada a uma boa dose de sorte. Além do tempo de maturação para a implantação das ideias dos novos mandatários. Se os conceitos estiverem errados, a maior probabilidade é de que, com o tempo, nada funcione. Se, ao contrário, estiverem corretos, há que dar-se um tempo para verificar se dará liga.
Justamente por ter acompanhado as duas vitoriosas gestões anteriores de Koff é que, pessoalmente, acredito em novo sucesso. Não importa que seja com o técnico A, com o goleiro B, com o zagueiro C ou o que for. Aliás, é até bem possível que venha um zagueiro novo para por ordem na defesa. Como qualquer gremista, óbvio que não estou contente com o desempenho da equipe e muito menos com os resultados de campo. Tenho certeza de que Koff está ainda menos e neste momento já está trabalhando para mudar isso. Se alguém ainda acha que este é um blog pró-Koff, saibam que já tive até post censurado e não publicado pelo maléfico Seu Algoz por haver a possibilidade de ser mal interpretado neste sentido.
Portanto, caros leitores do blog, um pouco mais de racionalidade. A presença de Koff pode não ser garantia de que ganharemos algo. Mas, pessoalmente, com ele por lá eu tenho, ao menos, esperança. Algo que muitos desistem de ter quando não chegamos sequer na metade da temporada. Bebam um pouco mais da fonte da memória e analisem de forma fria o que ocorrerá nas próximas semanas e nos próximos meses. Somente no final poderemos tecer juízo de valor.
Saudações Imortais