22 de junho de 2017

Esses analistas e suas análises maravilhosas

Um das mais recentes especialidades do mercado do futebol são os analistas financeiros de balanços de clubes. O blog Imortal Tricolor quer alertar os seus leitores para não darem atenção indevida a eles. A razão é simples: os analistas de balanços de clubes que se apresentam no mercado já deram mostras suficientes de que não entendem o funcionamento das finanças dos clubes e tampouco a estrutura dos seus balanços. Além disso, claramente não leem as notas explicativas das publicações contábeis.

Exemplos disso não faltam. Já tivemos o caso de um conhecido analista que desconsiderou as explicações sobre a dívida do Grêmio com a OAS, por conta do terceiro aditivo. Esta dívida só será paga com o lucro da própria Arena Porto Alegrense. O referido analista desconsiderou o fato (que estava minuciosamente explicado nas notas do balanço), alarmando-se com o "crescimento do endividamento do Grêmio". Este é apenas um exemplo. Outro clássico erro de novato foi a "informação" de que o Grêmio, em determinado ano, aplicara apenas R$ 1 milhão nas Categorias de Base. Esta era a diferença do saldo da rubrica no balanço entre os anos considerados e nada tinha a ver com o fluxo de despesas e dos investimentos. No caso, o Grêmio aplicara R$ 15 milhões na formação de atletas.

Uma característica da personalidade desses "especialistas" é que, do alto da sua neo-sapiência, não aceitam contraditório. Desfilam pelas rádios e tevês do país, semeando "conhecimento". Agora, apresenta-se uma nova face da escola para nós: a dos sábios com amnésia. Mas nós não sofremos deste mal. Olhem que curioso: abaixo, estão as páginas da análise de um clube gaúcho dos anos de 2016 (balanço de 2015) e de 2017 (balanço de 2016). Deem atenção especial para a última lâmina. Em vista da dificuldade de leitura dos prints, as análises foram transcritas e publicadas em itálico e na cor bordô.






Palavra do analista em 2016O trabalho em termos de correção de rumo foi muito bem feito em 2015. Os Custos e Despesas caíram 20% e associado ao aumento da Receita possibilitou uma boa geração de caixa, atingindo R$ 64 milhões. Mesmo considerando apenas as Receitas Recorrentes, ainda assim foi positivo, e mostra uma evolução quando comparado aos 3 anos anteriores, onde esta conta foi negativa.





Mais palavra do analistas em 2016: O Internacional sempre foi um modelo de gestão, que pensava no longo prazo, com bons números e desempenho equilibrado. Em 2014 o clube perdeu a mão, pensando apenas em conquistas esportivas, sem olhar para a saúde financeira. Passada a tempestade, o clube voltou aos trilhos em 2015, com alguma dor. O clube fez o dever de casa, conseguindo aumentar as receitas, reduzir custo e investimentos, equacionar as dívidas tributárias. Ainda assim, boa parte dos esforços serviu apenas para ajudar na correção da rota. Ainda falta ganhar tração. Isto significa dizer que o clube precisa manter a postura austera para poder voltar a ter força financeira e manter o time disputando títulos.


Vejamos: A análise diz que, em 2015, o clube “voltou aos trilhos” e “fez o dever de casa”. Logo, preparou-se para um 2016 saudável. Porém, no ano em que entrou pisando nos trilhos com as bochechas rosadas de saúde, caiu para a segunda divisão.

Agora, pasmem: na análise mais atual, o especialista previu o passado. O mesmo modelo de análise, sem nenhum pudor, encontra no balanço de 2016 do “modelo de gestão recuperado” e que "colocara a casa em ordem", a explicação para a queda para a segundona.










Palavra do analista em 2017: E o Internacional pagou o preço por uma estratégia que, quando não funciona, é fatal. Ao se tornar um clube altamente dependente da venda de atletas, quando elas não ocorrem, falta caixa. Para piorar a situação do clube, o dinheiro das luvas foi todo investido no futebol, mostrando total falta de planejamento. O resultado pode ser visto no Índice de Eficiência: queda para a Série B. O Internacional precisa ser usado como exemplo para os clubes que se apoiam demais na venda de atletas para fechar suas contas. Sem uma boa estrutura de custos, que torne o clube livre desta necessidade de vendas, sempre haverá o risco das coisas não darem certo. Daí, não só a bola pune, como o caixa, ou a falta dele também. E a reconstrução de 2017 será difícil, pois ao jogar a Série B o clube perde receitas e visibilidade. Trabalho duro à vista.


Por análises oportunistas como as acima, essas publicações devem ser vistas apenas como um local onde encontram-se compilados os dados contábeis dos principais clubes brasileiros, mas as suas análises preditivas são absoluta e totalmente desprovidas de utilidade. Eles precisam, urgentemente, fazer o seu próprio dever de casa: estudar (pode ser aqui no Brasil mesmo), a estrutura dos balanços e a dinâmica das contas dos clubes de futebol. Sem isso, nunca subirão para a Série A dos analistas de balanços do mundo do futebol.