20 de setembro de 2016

Daniel Matador - Acredite na magia



“- E ninguém lhe dá ouvidos, senhor? - perguntei a Merlin.
- Alguns sim - respondeu, ressentido. - Poucos, um ou dois. Artur, não. Acha que sou um velho idiota à beira da senilidade. E você, Derfel? Também acha que sou um velho tolo?
- Não, senhor.
- E acreditas na magia, Derfel?
- Sim, senhor - disse eu. Tinha visto a magia funcionar, mas também a vira falhar. Era algo difícil, a magia, mas eu acreditava nela.”

Diálogo de Merlin com Derfel na imortal obra “O Rei do Inverno”, segundo volume da trilogia Crônicas de Artur.
 
Acompanhado do mestre Valdir Espinosa, Renato acompanhou o treino na Arena (foto de André Ávila).


Caros

Em 2013 aproveitei um raro momento de folga e fui até a Arena para ver a volta da magia. No caso, acompanhei a apresentação de Renato Portaluppi para a torcida do Grêmio em seu primeiro treinamento aberto. Inclusive documentei aqui no blog, neste post aqui ==> http://blogremio.blogspot.com.br/2013/07/daniel-matador-volta-da-magia.html

A magia, assim como os milagres, é uma coisa meio estranha. Muitos não acreditam nela, dizem que não existe. Outros, meio reticentes, até creem em sua existência, mas duvidam de sua eficácia. Eu já sou de outra turma. Acredito na magia. Ela existe, duvidem ou não. Sabe aquele gol do Aílton na final do Campeonato Brasileiro em 96, faltando cinco minutos pra terminar o jogo? Magia. Aquele gol do Carlos Miguel no Maracanã lotado em 97, quando a torcida do Flamengo já comemorava o título da Copa do Brasil? Também foi magia. E o gol de Renato em Tóquio, na prorrogação, pegando o goleiro do Hamburgo no contrapé e coroando o Grêmio como Campeão do Mundo? Óbvio que era magia. Impossível discordar.

Grande parte da torcida não queria a saída de Roger. Mesmo esses, contudo, admitem que o ex-técnico, provavelmente o mais promissor da atualidade no futebol brasileiro, vinha pecando em alguns pontos cruciais. Por mais que todo treinador tenha seus bruxismos, a manutenção de determinados jogadores que não vinham rendendo contribuiu para minar seu trabalho. Diferentemente de seu mentor Tite, que sempre soube aliar a qualidade técnica à gestão de pessoas, Roger não domina este segundo quesito. E a incapacidade de ler uma partida em tempo real é, talvez, um de seus principais pontos negativos. A metodologia de toque de bola, não obstante os bons resultados que trouxe em muitas situações, nunca era alterada, estivesse o time ganhando, perdendo ou empatando. E isso é ruim, tanto que não me recordo de algum jogo que o time tenha virado o placar após sair em desvantagem (até pode ter ocorrido, apenas não me vem automaticamente à mente, o que corrobora o citado). Saber mudar o rumo quando a situação assim o exige é importante, para não dizer essencial. Roger é jovem, iniciante em sua carreira. Tem tempo para corrigir estes aspectos. Mas ele optou por corrigi-los fora do Grêmio.

E, quando o pragmatismo racional deixa de brilhar e dar resultado, aí apela-se para o imponderável. Como dizem na aldeia, entra o pensamento mágico. Recorre-se à mística. Apela-se para a magia. Não é correto? Provavelmente. A manutenção de um projeto, via de regra, costuma dar bons resultados. Mas é algo relativo. Chega uma hora em que, mesmo que possa haver um futuro promissor, o presente obriga a uma guinada de rumo. E aí, valendo-me de uma citação lá do Twitter, temos um ponto interessante a ressaltar. O pensamento mágico pode ser bom ou ruim. Vai depender do cacife do mágico. Uns apelam para David Copperfield, outros apelam para o Tio Tony. O resultado? Bom, temos uma amostra em certos times que estão na zona de rebaixamento.

Não dá pra exigir muito da magia quando o mágico é o Tio Tony.

Ao contrário do que muitos erroneamente apregoam, Renato não é um mero motivador ou um singelo distribuidor de coletes. Já acompanhei alguns treinos dele e atesto que muitos fundamentos técnicos e táticos são interessantes. A parte física entra também, mas aí é trabalho da comissão permanente. E a parte anímica, esta Portaluppi trabalha como poucos. E talvez seja justamente o que mais precisamos neste momento. Se souber utilizar parte do legado de Roger, Renato tem condições de fazer um bom trabalho, a exemplo do que fez nos outros dois Brasileiros em que comandou o time. Em 2010 pegou a equipe às portas do rebaixamento e classificou-o à Libertadores. Em 2013, com um elenco não superior ao atual, foi vice-campeão.

Portanto, há razões para acreditar. Nesta quarta-feira, às 19h30min, ele estreará na casamata contra o Atlético-PR pela Copa do Brasil precisando de um empate para classificar o time para as quartas-de-final do torneio. E aí faltarão apenas 6 jogos para o título. Sim, apenas 6 jogos. Difícil? Lógico, como tem sido a vida do tricolor nestes últimos anos. Impossível? Claro que não. Em sua coletiva de apresentação, ao lado de Valdir Espinosa, Portaluppi falou uma frase emblemática: "Não tenho varinha mágica". Ok, Renato. A gente sabe que nem todo mágico precisa disso para fazer seus truques. E talvez o que precisemos, nesta hora, seja justamente um toque de magia. Aquela que vem faltando há um certo tempo. Acredite na magia. Ela existe. Eu já a vi falhar, mas também já a vi funcionar. E ela está de volta.

Saudações Imortais