Acreditar é uma virtude. Quem não tem convicção nas coisas que faz é refém da sorte e acaba, quase sempre, por perder-se no caminho. Durante quarenta e três dias, Kroeff, Krieger e Meira entrincheiraram-se em sua convicção. Durante mês e meio, esperaram (e com eles a torcida) por Paulo Autuori, o homem das Arábias. Era de tal ordem o convencimento, que deixaram o time sem técnico em plena Libertadores da América, a Copa cujo direito de participação, para muitos, vale um centenário.
Acreditar pode tornar-se religião. Menos de meio ano depois, em exatos 175 dias, Autuori despediu-se dos jogadores, da Direção e deixou o templo.
Quem esteve no Olímpico na cerimônia do adeus não soube descrever a expressão nos rostos dos dirigentes gremistas. Não desvelavam convicta tristeza, não transpareciam genuína perplexidade, não espelhavam imagens de espíritos atônitos. Contudo, os semblantes imprecisos de forma alguma transmitiam a tranquilidade dos navegantes de boa bússola. Ao contrário, a falta de exatidão das imagens vinha do embaçamento do ambiente pelos vapores do desamparo. O que confundiu as percepções dos repórteres foi a aflição volatizada. No espaço, onde uma semana atrás havia asfalto e areia, surgira uma enorme cratera, sugando como um buraco negro toda a convicção que ousara apoiar-se sobre o "Projeto Autuori". Sem perceber, os que estavam no Largo dos Campeões presenciaram o velório da ingenuidade.
Quem acredita, aposta. Tamanha era a convicção dos senhores do Grêmio de que Autuori era o pilar principal do renascimento do futebol do clube, que não posso deixar de estar perplexo ao saber que a multa rescisória era irrisória. De que ingênua maneira se pensa o mundo dos negócios do futebol, a ponto de apostar montanhas de convicção sem adequadas salvaguardas? Não era de se esperar que partisse do clube a inicativa de romper o vínculo antes do prazo. Ora, os senhores do futebol do Grêmio acreditavam com tanta intensidade em Autuoti que tinham obrigação de fazer constar no instrumento contratual pesada multa de desistência. Ao não fazê-lo, agiram como noviços reverentes. Ingênuos colegiais deslumbrados com um achado precioso. Procedendo assim, expuseram o clube de forma desnecessária. A saída de Autuori, da forma como ocorreu, não podia estar no script do "planejamento", nem como um anexo de possibilidade emergente.
Nós, torcedores, que vivemos longe do mundo dos empresários, da matemática de fracionamento de direitos federativos, das negociações quase nunca transparentes, desejamos apenas poder torcer por um time vencedor. Se for possível, a atual direção do Grêmio e seus avalistas, devem tirar todas as lições possíveis deste e de outros equívocos que patrocinaram no ano perdido de 2009. Sem isso, 2010 será uma triste reprise. Não é admissível que a ingenuidade não seja imediatamente sepultada. Será doloroso sentir sua presença fantasmagórica em novos atos de um novo ano que terminará sem começar, mas que parecerá não acabar nunca.