21 de fevereiro de 2014

Um desabafo do cidadão Roberto Minuzzi

Ah!...como sonhei com este momento! Quantas vezes na minha vida perguntei ansioso para o meu pai quando teria uma Copa do Mundo ou Olimpíada no Brasil!? E de repente, o meu sonho de guri se realiza e, em um intervalo de dois anos, tem Copa e Olimpíada no Brasil! Sorte do meu filho, que acompanhará esses eventos com pura inocência.Como eu gostaria de ser criança ainda...

Simplesmente ficar encantado com a Copa, imaginando os craques que eu colecionava nas figurinhas pisando e jogando aqui...e mais: meu país com o técnico que eu tanto admiro e com um possível novo craque da Copa. Se eu já me emocionei realizando meu sonho de ver a seleção ao vivo, depois de 31 anos, quando jogou na Arena contra a França... Sonho que meu filho realizou com sete .   Mas, infelizmente, com trinta e dois anos sou obrigado a acompanhar todas as movimentações da Copa. E me entristece, me enche de raiva, de frustração, de vergonha, me deixa indignado e sei lá mais o quê, ver o que acontece. Pior! Ver acontecer o que já se sabia que iria acontecer... Quando o Brasil foi sorteado, tenho certeza que todos vibramos, gritamos como um gol! E quando o grito acabou, soltamos o ar e pensamos: o quanto vão roubar de dinheiro não vai ser brincadeira...

Dói ver tudo isso acontecer. Como desportista e apaixonado por futebol, dói muito. Já vi esse filme acontecer no pan-americano do Rio. Eu fui o último corte da seleção brasileira de vôlei e acompanhei tudo. Obras atrasando para conseguir um dinheirinho extra. Delegações chegando com  prédios sendo pintados, outros inacabados. Amigos da seleção com vergonha da recepção que era dada aos forasteiros.  Confundem-me os sentimentos que tenho por essa Copa. Passa-me, como apaixonado, a vontade que tudo se resolva... Mas me passa como cidadão brasileiro, a oportunidade de uma mudança no comportamento de todos. E eu vou tentar explicar esse sentimento.   

Joguei uma temporada na Grécia, no Panathinaikos. Em uma semana lá, percebi num dia que muitas casas colocaram a bandeira da Grécia na janela. A cidade ficou forte com aquela demonstração de patriotismo. E eu me senti um péssimo patriota. Na verdade me senti um verdadeiro  brasileiro com a pergunta que fiz a um jogador grego. O diálogo foi mais ou menos assim: 
-Vai ter jogo da seleção grega de futebol aqui?
-Não, por quê?
-Porque todo mundo colocou bandeiras nas janelas...
-Ah! Porque hoje é o dia do não. Dia que dissemos não para a Itália e os expulsamos da Grécia em (bom, me deu uma aula com datas e fatos)
- É que no Brasil, só vejo bandeira quando tem futebol (completamente envergonhado)
A Grécia comemorou mais alguns dias do não. Foi um país que foi invadido por todo mundo. E a cada guerra, se renovava o espírito patriota. 
Um ano depois da minha saída, estourou a crise financeira na Grécia e um e-mail que recebi deste amigo dizia: “Acho que chegou a hora de lutarmos novamente e nos regenerar!”  
Isso ficou na minha cabeça. Aqueles gregos iam pra rua por qualquer desvio de conduta de algum político, padre ou policial. Ou cidadão. Aqui temos provas claras de roubos, de mensalões, de superfaturamentos... Nós sabemos disso e nunca fizemos nada. Agora, se o técnico do time perde alguns jogos, todos vão ao portão do clube xingar e pedir mudanças!
Aqui no Brasil não se tem essa paixão pelo país como os gregos tem. Aqui tem pelo futebol. E assim eu explico meu sentimento de cidadão. A única maneira do povo se indignar, abrir os olhos, se sentir envergonhado pela roubalheira é vendo a podridão dos nossos líderes contagiando o meio do futebol. Aí vai mexer na paixão do brasileiro. 
E não devo estar muito equivocado nessa ideia, pois foi bem na época da Copa das Confederações que todos foram as ruas. Cada um com a sua causa, seu propósito. Mas o que atiçou todos foi ver materializado ali, um evento, estádios novos, jogadores milionários, obras superfaturadas, dinheiro público jorrando ali, na cara de todos. E quando cada um olhava para si, via na sua família ou ali no vizinho, alguém que se F*** bonito porque não tinha vaga no posto de saúde, ou não tinha segurança na rua, ou não tinha professor na escola, ou o salário era uma vergonha, ou os impostos eram muitos, ou, ou ,ou.....  
Dói ver que 30 milhões são aprovados assim, em 12 horas como pediu o bonitão da FIFA. 
Se cria uma lei, baseada em outra que foi feita para o esporte amador copiando uma lei de incentivo  a cultura. Lutamos anos para essa lei sair. Saiu. 
Nós do vôlei de Canoas, temos metade do salário para receber quando nosso projeto que está esperando liberação  há algum tempo for ativo. Estamos desde Julho jogando e a temporada acaba agora em Março. E ainda nada. Tenho medo que agora com esse repasse, justamente na isenção do ICMS,  não veja nem a cor. Mas o que mais dói como cidadão é ver o post dos colorados que trabalham no TCE, MP e sei la mais que siglas e que, na cara de pau, vestem a camiseta do time para trabalhar. 
É tanta coisa que me deixa transtornado, que o seu Algoz me pediu um post para falar do Grêmio
Eu comecei a escrever com a ideia de somente  comentar o post destes babacas no poder, mas estou até agora vomitando meu nojo no meu computador. 
Gente, não tem como não passar por um hospital lotado, um posto de saúde que atende só a emergência da emergência e não ficar com esses R$ 30 milhões na cabeça. 
Não tem como ver ruas desertas de polícia e não pensar nestes R$ 30 milhões. 
Não tem como ver os próprios policiais, médicos, professores sem estrutura pra trabalhar e não pensar nesses R$ 30 milhões. 
Não tem como aceitar estes R$ 30 milhões, ainda mais sabendo que são 30 agora e já foram quantos mais... 
Quero, pelo meu filho, que de tudo certo na Copa porque ele ama futebol. Mas se o pau quebrar, se passarmos vergonha, se o povo se rebelar em prol de mudanças de verdade, também quero que isso aconteça pelo mesmo filho (e pelas 3 filhas), pois é a chance que teremos, de nos regenerar, como disse meu amigo grego. 
Um abraço a todos, e em breve escrevo sobre o nosso time que tem me deixado feliz pela postura e pela velocidade (até que enfim!).

Minuzzi