No texto, uma pergunta e uma resposta: Qual o risco que as prisões oferecem ao clube e ao estádio? A princípio, mínimo. Os documentos gritam o contrário (há muitos no post "Mentira; braços longos e pernas curtas").
Para responder à pergunta corretamente, deve-se desenhar o contexto jurídico do negócio. Para tanto, cabe definir dois termos chaves para a compreensão do contrato: direito real de superfície e alienação fiduciária.
Sobre o Direito de Superfície
O direito de superfície é o direito que uma pessoa física ou jurídica adquire sobre coisa alheia e tem por principal característica o poder explorar economicamente o bem objeto da transação. Tem como efeito destacar a propriedade do solo da propriedade da superfície. Tudo o que for existente e construído na superfície durante a vigência do DRS, pertence ao proprietário superficiário.
O direito de superfície não se confunde com o arrendamento. Aquele é uma relação de direito real, enquanto o arrendamento é uma relação de direito obrigacional. O arrendatário não é dono da coisa arrendada, enquanto o superficiário é dono da propriedade superficiária.
Sobre Alienação Fiduciária
Também chamada de alienação em garantia, Alienação Fiduciária é a transmissão da propriedade de um bem ao credor para garantia do cumprimento de uma obrigação do devedor. Essa modalidade de garantia em negócios envolvendo bens móveis, foi criada pela Lei n° 9514/97. [...] Para o credor, esse tipo de garantia trouxe a novidade de, caso o devedor não liquide sua obrigação no vencimento, poderá requerer a ação de busca e apreensão do bem alienado e, após apossar-se do mesmo, vendê-lo a terceiros, aplicando o valor de venda no pagamento de seu crédito.[...] Essa forma de garantia desobriga o credor de ter que acionar o devedor e somente depois ir à busca do bem objeto da garantia, facilitando e apressando o retorno de seu investimento.
Isso dito, vamos nominar quem são os sujeitos destacados acima, no caso do negócio e do financiamento para construção do estádio da Copa. Para tanto, vamos nos valer da matrícula 6.258, do Serviço de Registro de Imóveis da 5ª Zona da Capital:
Objetos da transação: estádio Beira-Rio e edifício garagem
Proprietário superficiário: SPE Holding Beira-Rio S/A (a Brio)
Devedor: SPE Holding Beira-Rio S/A (a Brio)
Credores: BNDES, Banrisul e Banco do Brasil
O documento só deixa dúvida para quem quer tê-la: o Sport Club Internacional cedeu à Brio o direito real de superfície da totalidade do estádio e da totalidade do edifício garagem, por 20 anos. Não há que se levantar a questão da exploração comercial pela Brio das suítes, cadeiras vips, lojas etc, para distinguir dos direitos do clube sobre cadeiras do primeiro anel etc. Este é um acordo comercial, algo diverso da propriedade da totalidade do imóvel do estádio e do edifício garagem, que é, inequivocamente, da Brio. Lembrem da definição acima: "... o superficiário é dono da propriedade superficiária".
Na segunda perna do negócio, como garantia do financiamento feito junto aos bancos (credores), a Brio cedeu a estes, em alienação fiduciária, os imóveis em questão, quais sejam: o estádio e o edifício garagem. Como vimos, alienação fiduciária pressupõe transmissão de propriedade. Como sabemos, ninguém pode ceder aquilo que não lhe pertence. Logo, a Brio (cujos donos são a AG e o Banco Pactual, veja link) repassou de si, proprietária, a propriedade da totalidade dos imóveis do estádio e do edifício aos bancos, conforme pode-se constatar na matrícula acima. Desejando verificar os sujeitos e as garantias do empréstimo no portal da Copa, clique aqui. A imagem abaixo foi retirada desse link.
À luz do documento mostrado e das suas implicações jurídicas, a única resposta plausível para a oportuna pergunta contida no título da matéria da Época ("O que Internacional e Beira-Rio têm a ver com a prisão de Esteves, do BTG, na Lava Jato") é TUDO. Não sendo pago o financiamento, a garantia pode ser executada, passando todo o estádio e o edifício garagem (bem como todas as rendas geradas pela exploração) para o controle dos bancos credores, para pagamento do empréstimo.
Tudo o que se disser contrariamente a isso é por tolo desconhecimento ou por dever cívico de acreditar no que a direção do antigo proprietário do Beira-Rio (Sport Club Internacional) manda que se acredite. Se nada mudar, em março de 2032 essas pessoas terão, finalmente razão ao afirmar que o SCI é o dono do Beira-rio.