10 de março de 2015

Daniel Matador - Tudo friamente calculado



"Foi o único que me enganou."
Napoleão Bonaparte, em trecho de suas memórias escritas pouco antes de morrer no exílio da ilha de Santa Helena, referindo-se à fuga de Dom João VI de Portugal para o Brasil.

Caros

Para os que não mataram as aulas de história, Napoleão Bonaparte é uma figura conhecida. Foi o homem mais poderoso de sua época, conquistador de países e comandante do mais formidável exército de então. Em 1807, Napoleão era o senhor supremo do continente europeu. Dominava a Holanda, a Bélgica, a Itália e a Alemanha. Mesmo os monarcas da Áustria e da Rússia eram obrigados a assinar tratados humilhantes e submeterem-se a seu jugo. Apenas uma nação desafiava sua força: a Inglaterra, por conta de seu poderio militar naval.

Naquela época, uma região que ainda não havia sido conquistada era considerada uma presa fácil para o exército napoleônico: a Península Ibérica, formada por Espanha e Portugal. Apesar de uma inesperada resistência inicial, a tomada das duas nações era questão de tempo. Todos diziam que ambos os países seriam devastados e os governantes seriam depostos ou mesmo mortos. Até que o príncipe regente Dom João VI, que governava o país em nome de sua mãe Maria I, conhecida como Rainha Louca, pôs em ação um plano que havia sido elaborado há muito tempo para ocasiões como esta, antevendo a possibilidade da vitória de Napoleão.

Dom João VI reuniu a corte portuguesa e lançou-se de navio para o Brasil, onde iniciou um novo reinado, longe do confronto armado. Muitos não acreditaram na eficácia de tal plano e ficaram na Europa, sendo mortos ou tendo seus bens confiscados. Mas o plano funcionou e o príncipe regente deixou o poderoso Napoleão chupando o dedo, com as outras nações lutando contra o general enquanto ele curtia o clima tropical de nossa terra. Depois que Napoleão foi vencido, retornou para governar Portugal. Cometeu várias outras patetices, mas sua estratégia até hoje é lembrada como uma das mais audazes de todos os tempos e garantiu a sobrevivência da casa real portuguesa.

Pois desde o ano passado o Grêmio vem sofrendo de um mal semelhante ao do reino português que via os exércitos napoleônicos chegando. Todos falavam que o clube estava quebrado. O então presidente eleito havia decretado um plano contingencial para sanar o clube, já prevendo a mudança de cenário que ocorreria no futebol brasileiro nos anos seguintes. Jogadores com contratos caros foram dispensados e o perfil da equipe foi redefinido. Parte da torcida torceu o nariz. “O Grêmio está apequenando-se!”, bradavam uns. “Somos candidatos ao rebaixamento!”, vociferavam outros. A ivi, então, não deu trégua. Para eles, a derrocada gremista era questão de tempo. A apresentação de alguns resultados ruins em campo, muito por conta da necessária experimentação do elenco remanescente, foi a gota d’água para os profetas do apocalipse montarem em seus cavalos e gritarem a plenos pulmões que tudo estava perdido. Sobrou até mesmo para o multicampeão Luis Felipe Scolari, acusado de ser antiquado. Mesmo assim, a direção manteve-se firme no propósito traçado e friamente calculado.

Mas sabiam os detratores que havia muito mais nesse plano do que apenas a dispensa de jogadores dispendiosos. Toda uma reformulação do clube enquanto instituição estava sendo gestada. Dívidas começaram a ser pagas. Despesas começaram a ser gerenciadas. Processos começaram a ser redefinidos. E a figura do técnico Felipão foi um dos alicerces desta mudança. E o Grêmio começou a mudar. A postura no Gre-nal, quando os fatalistas diziam que seríamos goleados na beira da sanga, já mostrou uma outra cara na equipe. A vitória sobre o Caxias na Arena trouxe um novo ânimo para a torcida. E os reforços começaram a chegar. Veio Braian Rodríguez, um 9 de ofício. Veio Maicon, meio-campista tarimbado. E veio Cristian “Cebolla” Rodríguez para coroar o primeiro rol de reforços desta nova era tricolor, um meia da seleção uruguaia cuja capacidade e títulos o precedem. E aí, assim como Napoleão ficou com a boca aberta após ser enganado por Dom João VI, a torcida adversária e os outros times ficaram estupefatos com o fato de um clube “quebrado” ter conseguido aliviar sua folha de pagamento e ainda assim ter reforçado-se com jogadores de renome.

Nesta quarta-feira o Grêmio jogará em Erechim contra o Ypiranga, um dos mais tradicionais clubes gaúchos. Dono do maior estádio do interior, o Colosso da Lagoa. E é muito provável que Braian Rodríguez já faça sua estréia neste jogo. Maicon e Cebolla estão sendo preparados para que possam estrear na Arena no próximo sábado, contra o Cruzeiro. Em Erechim o time deve contar com Marcelo Grohe no gol, Matías Rodríguez e Marcelo Hermes nas laterais e Rhodolfo e Erazo na zaga. Marcelo Oliveira, Fellipe Bastos, Giuliano e Douglas formam o meio de campo. No ataque, Yuri Mamute junta-se a Braian Rodríguez. Para atrapalhar, o juiz é o conhecido Chico Colorado.

Em tudo correndo como o planejado, as coisas tendem a andar de forma mais harmônica para o clube e para o time. Os profetas do apocalipse sumiram nos últimos dias. Eles não fazem falta nenhuma. O verdadeiro torcedor, este sim é primordial para que o plano de ascensão do Grêmio dê frutos. E aí, nada mais nos segura. E poderemos voltar a reinar.

Saudações Imortais