11 de setembro de 2012

Olímpico Eterno [7]


O nascimento de um Libertador

Por Urtigão

No ano de 1983, pode-se dizer que eu já vivia, intensamente, tudo que se relacionava ao Grêmio. Já havia participado da escolinha sob o comando do saudoso Paulo Lumumba. Um piá inocente (sim, naquela época os piás eram inocentes) que só pensava em se divertir e “brincar” de jogar futebol. Fiz minha carteirinha da Máquina Tricolor e participava de todos os jogos. Ia ao estádio sozinho com 12 anos. Chegava, em dias de jogos à noite, de tarde e ficava arrumando bandeiras, papel picado, etc. Tinha a saudosa camiseta do time de 1981. 
Naquela época, somente os dois primeiros colocados no campeonato brasileiro iam para a Libertadores. Como tínhamos sido vice-campeões no ano de 1982 em uma disputa com o Flamengo e o juiz (pra variar, a roubalheira contra nós é histórica), fomos para o certame mais importante das Américas. Vejam bem, somente os primeiros colocados eram selecionados e não havia times mexicanos (fakes). A Libertadores era a maior fumaceira! Jogar contra los hermanos, então, era um desafio indescritível. Só para terem uma ideia, não existia, ainda, a tal frase fair play. Do pescoço pra baixo era tudo canela! O futebol bretão na sua essência. Fomos passando de fase e não lembro bem em quais jogos fui. Mas sei que, contra o Bolívar, quando o Mazaropi defendeu pênalti e ganhamos de 2 x 1 eu não estava, pois era de tarde e tinha aula. 
Chegamos à final contra o Peñarol, um dos melhores times da América na época. Uruguaios na verdadeira acepção, ou seja, sem tiaras. 
O primeiro jogo foi em Montevidéu e passou na TV. Uma fumaceira. Jogo truncado, poucas chances, um embate em que cada palmo de campo era disputado com unhas e dentes. Empate. Bom negócio? Em uma final de Libertadores daquela época, nunca seria. 
O jogo de volta foi no Olímpico recém expandido (a obra acabou em 1980, não por acaso um ano antes do início do primeiro ciclo de vitórias do clube). Caso houvesse novo empate, nada de pênaltis, haveria outro jogo. A sorte só entrava se não houvesse mais nenhuma opção na equação da escolha do melhor entre os melhores. 
Dia de jogo nervoso. Fui para o estádio à tarde, como de costume, para aprontar tudo. Voltei para casa, pois minha mãe assim o exigiu. O pessoal da torcida disse que eu não conseguiria entrar no estádio, que estaria lotado. Fiquei apreensivo... 
Fui cedo, mesmo assim, a cancha já estava tomada. Resolvi entrar com meu pai pela social e deixar a torcida nesse dia. Surpreso, vi que as torcidas haviam sido remanejadas nos seus espaços e a minha estava na social. Beleza. Fui para lá. Era ensurdecedor o barulho, a cantoria. E era quase impossível de ver o jogo por causa das bandeiras (daquelas muito grandes) e do frenesi. Sem falar que eu era um guri de 12 anos vendo o jogo praticamente no nível do campo. 
Quase não vi o gol do Caio. Depois desse gol, quase não vi jogo. A torcida estava extasiada, não parava de cantar um minuto. A coisa só arrefeceu um pouco quando o Peñarol empatou. E a angústia ficou estampada nas expressões de todos. A torcida deles aumentou a festa, sim, outra diferença é que, naquela época, havia um espaço grande para a torcida adversária. Havia sido assim contra o Flamengo. Quase toda metade do anel superior e mais um tanto no inferior. Era chato por um lado, mas, hoje, lembrando daquilo, digo que essa é a essência da disputa, do jogo. Irmão lado a lado com irmão. Quem perde, baixa a cabeça e vai para casa. Ao vencedor, os louros da vitória. 
Não sabia quanto tinha de jogo. Meu MP3 pré-histórico (leia-se radinho de pilha) não servia para nada no meio daquela gritaria e frenesi. Só sabia que os ânimos da Máquina Tricolor não diminuíram. Tentava ver alguma coisa do jogo, mas era praticamente impossível. Uma jogada aqui, um carrinho ali... Subitamente, todo estádio Olímpico Monumental explode em um grande grito que, suponho, tenha sido ouvido até mesmo na beira do lago, lá pras bandas do Menino Deus. 
Goooooolllll. Não vi, mas vibrei e continuei a vibrar até o final do jogo. Cantando, pulando. Até o apito final do juiz. Eu vi, ao vivo e a cores, Hugo De León, um dos melhores zagueiros que vi jogar na vida, levantar a taça com a face sangrando. A cena que se tornou um ícone do futebol. Eu estava lá. Sei que aconteceu. Não foi sonho, apesar de tudo parecer, hoje em dia, uma lembrança distante.